19 dezembro 2004

Construção



Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

Chico Buarque, 1971

20 agosto 2004



Mariana regressa a casa. Desespera por um relaxante banho de sais. Antes espera-a o cheiro da multidão que como ela regressa depois de uma semana em Agosto chuvoso. As férias já foram e com elas os filhos, que por estes dias ficam com o ex-marido no apartamento que foi dos dois, na Costa da Caparica. Frusta-a a facilidade com que ele a convenceu, como sempre a convenceu de tudo, mesmo quando a abandonou. Quase refeita, vai de fim-de-semana com as amigas, para um apartamento alugado em Tróia. Hoje ainda há cinema e pipocas, uma comédia romântica qualquer, e um copo algures.



"Estou viva", murmura repetidamente

11 agosto 2004



em dias já algo distantes entrei, ainda ensonado, numa pequena padaria na av. de berna, já não muito distante do campo pequeno. passavam os minutos antes de uma entrevista de emprego, quando fui resgatado ao nervosismo por um odor salivante a pão fresco. entrei, percorri a bancada com o olhar distante no pão fresco que em miudo comprava numa padaria perto de casa, daquelas onde a lenha perfuma e tempera. pedi uma bola, daquelas, se faz favor. obrigado. quanto é?

enquanto espero resposta, entra uma voz familiar, daquelas que facilmente reconheço mas não associo à pessoa (faço o mesmo com as caras, admito), não espera pela sua vez, está com pressa, avisa, é atendido e despede-se: até amanhã às oito...

05 agosto 2004


a monotonia preenche os dias de vazio
a desordem surge como agente libertador, fixando o pensamento na margem do quotidiano.

10 julho 2004


O Sr. Presidente da República falou ao Pais.
Hoje sinto-me de luto, perdi alguém que apreciava...

05 julho 2004



"A felicidade do pobre parece
A grande ilusão do carnaval
A gente trabalha o ano inteiro
Por um momento de sonho
Pra fazer a fantasia
De rei ou de pirata ou jardineira
Pra tudo se acabar na quarta-feira"

in A felicidade, de Vinicius de Moraes

28 junho 2004


O alinhamento de Durão aos interesses americanos valeu-lhe a nomeação para fantoche oficial da Europa...

11 junho 2004



“As trevas estão por aí, escondidas,
À espera que eu apague a luz
Para se lançarem sobre mim”

Adolfo Luxuria Canibal

02 junho 2004



"Dorme meu menino a estrela d'alva
Já a procurei e não a vi
Se ela não vier de madrugada
Outra que eu souber será pra ti"

José Afonso

25 maio 2004

Peniche 2004



"Escrevo porque tenho memória e a cultivo escrevendo..." Luis Sepúlveda